Desastres com caminhões e carretas matam mais de 9 mil em menos de 4 anos
Sinistros envolvendo transporte pesado representaram quase 45% dos casos fatais em BRs do país de 2022 a julho deste ano. E Minas é o estado com mais mortes
Publicado: 07/12/2025 às 09:17
Carreta tem cabine destruída em acidente na marginal da BR-381, área urbana de contagem (Foto: Edésio Ferreira/EM/D.A Press)
Montes Claros, Francisco Sá, Grão Mogol, Brumadinho, Itatiaiuçu e Rio Manso – Em um período de menos de quatro anos, 9.631 motoristas, passageiros, motociclistas, ciclistas e pedestres morreram em sinistros envolvendo veículos pesados de carga, em um universo de 21.701 óbitos totais registrados em rodovias federais brasileiras. O estado onde mais pessoas perderam a vida em sinistros com carretas e caminhões foi Minas Gerais, com 1.489 mortes, 15,5% do total nacional. Em seguida vêm Bahia e Paraná, com 11%; Santa Catarina, com 7,5%; e Mato Grosso, com 5,8%.
Nesse mesmo recorte de tempo, dos 297.094 feridos em geral no país, 66.046 (22%) estavam em ocorrências envolvendo veículos de carga. Dados que reforçam a importância de um olhar ainda mais dedicado a essa modalidade de transporte.
A localização centralizada de Minas Gerais, interligando o Sudeste e o Nordeste brasileiros, bem como o litoral e o Centro-Oeste, e sua vasta capilaridade de vias, transformaram o transporte pelo estado em um cenário violento, avalia o professor Raphael Lúcio Reis dos Santos, do Departamento de Engenharia de Transportes do Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais (Cefet-MG), que ajudou na elaboração e nos conceito desta reportagem.
“A extensa malha rodoviária mineira (a maior do Brasil, com 36 mil quilômetros), contribui para o grande número de veículos pesados trafegando e, consequentemente, para o número expressivo de acidentes. A letalidade é alarmante. Embora os veículos pesados não sejam os mais representativos, o grande número de mortes é um indicativo de que os sinistros são particularmente mais graves em Minas. Um quadro de tragédia constante, que sublinha a urgência de intervenções específicas e eficazes”, observa o especialista.
“Nos acidentes em que está envolvido, dificilmente o motorista de caminhões grandes morre. Os carros pequenos é que têm maiores perdas, pois o veículo de carga tem mais proteção. Nele, o motorista está mais alto. Mas justamente quando os condutores de carretas e caminhões são vítimas é que os acidentes tendem a ser mais graves, mais capazes de afetar o setor”, observa a psicóloga especialista em trânsito Adalgisa Lopes, presidente da Associação de Clínicas de Trânsito de Minas Gerais (Actrans-MG).
Quando o impacto chega até o motorista
Por isso, o retrato mais impactante dos desastres envolvendo veículos pesados é o dos sinistros que, de tão graves, afetam quem está dentro das cabines. Um dado extraído a partir de 63.833 ocorrências de trânsito registradas pela PRF. São boletins referentes aos ocupantes de carretas e caminhões entre vítimas identificadas (desde ilesos até os mortos) de 2022 a julho de 2025, intervalo em que 2.066 pessoas morreram e 23.308 ficaram feridas.
Depois de Minas Gerais, onde os ocupantes do transporte de cargas em caminhões e carretas mais se envolveram em ocorrências, com 10.159, vêm o Paraná (7.573), Santa Catarina (6.303), Bahia (4.701) e Rio Grande do Sul (4.085). A cada cinco mortos, um faleceu em desastres ocorridos em Minas Gerais, que registrou 444 óbitos (21,5% do total nacional), seguido por Paraná (242), Bahia (218), Mato Grosso (161) e Goiás (118).
A armadilha da zona urbana
Entregas, carga e descarga ou travessias de áreas urbanas brasileiras muitas vezes drenam a atenção e exigem paciência dos motoristas. Sobretudo quando conduzem gigantes imersos, como caminhões e carretas, em meio ao tráfego local. Nada menos do que 38% das batidas e atropelamentos envolvendo veículos pesados de carga em rodovias dentro das cidades ocorreu por falhas de reação dos condutores ou entrada em vias sem observar o trânsito, segundo os dados da Polícia Rodoviária Federal (PRF).
Um terço dos sinistros mais frequentes com os grandes cargueiros nas cidades foram colisões traseiras (18%) e quedas de motociclistas (15%), mesmo onde as pistas são duplas ou múltiplas.
Quando cortam as cidades, as rodovias aparentemente são ideais para dirigir, porque são muitas vezes mais largas, com melhor pavimento, mais bem sinalizadas e iluminadas. Mas os impactos do tráfego urbano para o condutor de veículos de carga superam a vantagem dessa infraestrutura, segundo a presidente da Actrans-MG.
“O condutor de caminhões está adaptado a pistas de tráfego mais constante e a um tipo de atenção que se chama concentrada, variando praticamente quando precisa mudar de pista para ultrapassar. Na cidade, devido ao tráfego dinâmico, esse condutor precisa usar a atenção dividida e a atenção alternada. Ou seja: tem de olhar para vários lados, saber se tem motos passando pelo corredor, carros entrando na frente em menor velocidade, semáforos, quebra-molas e pedestres”, enumera Adalgisa Lopes.
“Ele precisa de mais atenção. Porém, aí entram o cansaço da jornada prolongada, a tensão pelo atraso na entrega e muitas vezes o uso de drogas para rodar por mais tempo, tentando driblar a fadiga”, afirma a psicóloga especialista em trânsito.
Risco maior nos rincões do país
A dor e os prejuízos são piores somente quando os veículos com carga cortam o Brasil rural. É onde se concentram 71% das ocorrências e 92% das mortes dos ocupantes das carretas e caminhões. Quase metade dessas vítimas estavam em veículos sem controle, em saídas de pista (16%), tombamentos (16%) e capotamentos (14%), sobretudo em curvas e descidas.
Violência que em tese seria evitável, pois um de cada cinco sinistros fatais envolvendo o transporte pesado fora das cidades se deveu ao excesso de velocidade (20%).
De acordo com o diretor de Operações da PRF, Marcus Vinícius de Almeida, todos os segmentos com mais sinistros e mortes são patrulhados com cuidados especiais para garantir mais segurança, inclusive para os veículos de carga. “No caso das carretas e caminhões, o excesso de velocidade, as ultrapassagens indevidas, o uso de álcool e de outras drogas nos preocupam bastante. Por isso seguimos as estatísticas com indicativo dos pontos críticos e realizamos grande quantidade de testes de etilômetro”, afirma. “Nesses cenários, temos os tipos mais graves de ocorrências, como as colisões frontais ligadas a ultrapassagens em locais indevidos”, relata.
As informações são do Estado de Minas.